Roni Martins
A pedra que não rola encontra a água que não flui. Juntas discutem o futuro das folhas que não caem.
Capa Meu Diário Textos E-books Fotos Perfil Livros à Venda Livro de Visitas Contato
Textos
A Energia Sexual
A vida moderna conduz o ser humano, lenta e silenciosamente, ao esgotamento psíquico, físico e mental. Dotado de um sopro de vida — essa centelha que o anima —, sua existência pode ser dividida, em termos gerais, em três grandes períodos: o primeiro, dedicado à formação; o segundo, à conquista daquilo que a sociedade lhe induziu como sendo “o seu lugar no mundo”; e o terceiro, muitas vezes, à maturação. Nesta última fase, é comum que o vazio ou a frustração surjam como resultado de uma vida desconectada da essência. No entanto, para aqueles que souberam escutar o silêncio interior ao longo do caminho, o terceiro período pode tornar-se o mais fecundo: tempo de sabedoria, de serviço sem desejo de recompensa, de uma contribuição silenciosa à humanidade — como a árvore que, ao final de seu ciclo, oferece sombra, frutos e sementes.

No segundo período, especialmente, o homem é levado a crer que, se não alcançar o padrão socialmente estabelecido de sucesso, fracassou. Essa compreensão distorcida — alimentada por ideais externos e desconectada de sua essência — contribui para o seu afastamento de si mesmo e da sua realização mais profunda: a teo-realização.
A teo-realização pode ser compreendida como o processo pelo qual o ser humano reconhece, cultiva e manifesta a presença do divino em si mesmo. Não se trata de aderir a um sistema religioso específico, mas de trilhar um caminho interior de retorno à origem, à Fonte. É a tomada de consciência de que a verdadeira identidade do ser não se limita ao corpo, à mente ou ao papel social que desempenha, mas repousa numa dimensão mais profunda — espiritual, eterna. Teo-realizar-se é permitir que o sagrado, que habita em silêncio no íntimo de cada um, possa emergir e orientar a existência. É sair do automatismo do mundo exterior para viver de forma plena, consciente e integrada com o Todo.

Para que essa teo-realização seja possível, há um tipo de silêncio que não é ausência de som, mas presença de essência. Um silêncio que fala por dentro, que respira junto com a vida, que acompanha o ser humano como um velho amigo — discreto, mas confiável e firme. Aqueles que aprendem a escutar esse silêncio interior descobrem que nele reside um segredo: a economia da alma. Há quem gaste e disperse sua energia criadora, e há quem a preserve com paciência — e, com ela, aquece a casa, move os pensamentos, cria a arte e sustenta o corpo. Esses caminham com mais leveza, falam com mais profundidade, amam com mais presença. Sua força não está no excesso, mas na direção.

Nesse processo, torna-se essencial reconhecer uma força silenciosa que habita o coração do ser humano. Ela pulsa no âmago do corpo e reverbera nos pensamentos, nas emoções e nas ações. Quando desgovernada, essa energia consome e dispersa; quando governada, transforma-se em longevidade, plenitude, arte profunda e pensamento claro. Em tempos antigos, foi chamada de fogo, sopro ou serpente. Não se trata de um mistério reservado apenas aos iniciados — essa energia está presente em todos nós, aguardando ser compreendida, cultivada e colocada a serviço da intimidade, da criação e do amor.
Para que a teo-realização seja possível, é preciso cultivar práticas que favoreçam a integração entre o corpo e o espírito. O silêncio interior, a meditação, o trabalho consciente, a arte vivida com presença, o autocontrole e o uso responsável da energia sexual são caminhos que conduzem à harmonização do ser. Não se trata de reprimir os impulsos naturais, mas de transmutá-los em força criadora e consciência desperta. O corpo, longe de ser um obstáculo à espiritualidade, é o templo onde o sagrado pode se manifestar. Quando bem orientado, torna-se instrumento de ascensão — ponte viva entre o terreno e o eterno.

A energia criadora — tantas vezes reduzida à sua expressão sexual — é, na verdade, uma das forças mais fundamentais da natureza humana. Diversas tradições filosóficas, científicas e espirituais a reconheceram sob diferentes nomes e simbolismos: os alquimistas a viam como fogo sutil; a psicanálise a nomeou libido; antigas culturas orientais a associaram ao prana ou kundalini. O que todas elas parecem intuir, à sua maneira, é que essa força, quando dispersa sem consciência, esgota e desorienta; mas quando canalizada com discernimento, eleva, vitaliza e enobrece. Falar disso não é propor uma fuga do mundo ou uma repressão dos sentidos — ao contrário: é um convite a viver com mais presença, mais profundidade e mais clareza. É reconhecer que o ser humano carrega em si uma potência rara, e que dela pode nascer tanto a destruição quanto a criação, tanto o automatismo quanto a liberdade. O cuidado com essa energia não é, portanto, uma crença pessoal: é uma sabedoria universal, que atravessa os tempos e as culturas, aguardando ser redescoberta.

Entre as muitas tradições que investigaram o mistério da energia criadora, a Gnose ocupa um lugar singular. Ela não apenas reconhece o seu papel essencial no processo de autoconhecimento, mas enfatiza que essa energia, quando desperdiçada inconscientemente, contribui para o adormecimento da alma e a perpetuação do sofrimento humano. Sob a ótica gnóstica, o caminho da teo-realização exige um despertar gradual, que passa pelo domínio de si mesmo e pela transmutação da energia sexual em luz interior. Não como negação da vida, mas como sua vivência mais lúcida. Assim, o cuidado com essa força vital deixa de ser uma moral imposta e se transforma em uma escolha consciente, íntima, silenciosa — um gesto de amor à própria existência e ao divino que nela habita.

Não há um único caminho ou método que possa ser imposto de fora para dentro. Cada ser humano é convidado a encontrar, por si, os meios que favoreçam a escuta interior e a elevação da própria energia. Tradições como a gnose, o yoga, o taoismo e o cristianismo místico legaram práticas e ensinamentos que podem servir de guia, mas o mais importante é a disposição sincera de caminhar com atenção, respeito e paciência consigo mesmo. Mais do que buscar uma técnica, trata-se de despertar uma atitude: de cuidado, de presença e de reverência diante da vida que pulsa em nós.
Roni Martins
Enviado por Roni Martins em 12/04/2025
Alterado em 14/04/2025
Comentários
A Serpente de Bronze R$ 70,00
A Serpente de Bronze R$ 35,00